Insatisfeitos com a atuação da Força de Pacificação na mediação de pequenos conflitos no Complexo do Alemão, os moradores da favela da Grota, zona norte do Rio de Janeiro, passaram a se referir ao Exército como "Comando Verde", em alusão ao nome da facção criminosa que controlava a região antes do processo de pacificação, o Comando Vermelho (CV).
Várias faixas com mensagens de protesto foram colocadas nesta terça-feira (6) nos acessos às comunidades. "O povo do Alemão é humilhado pelo Exército. Sai o Comando Vermelho, entra o Comando Verde", diz um dos cartazes.
A crise no relacionamento entre os militares e a população local estourou depois de um tumulto no último domingo (4), quando um grupo de cerca de cem soldados agiu de forma truculenta para conter a revolta da população local - eles utilizaram spray de pimenta e efetuaram disparos de balas de borracha contra os clientes de um bar no alto do morro.
Segundo uma moradora da Grota, após a confusão, o Exército impôs toque de recolher na região, e nesta segunda-feira (5) muitos moradores foram obrigados a voltar para casa até 22h.
"Fui visitar uma amiga e tive que dormir na casa dela, não podia nem chegar na janela. Os soldados estão com raiva, e os moradores estão voltando a ter o mesmo medo que existia na época em que os traficantes estavam aqui", disse ela, que pediu anonimato.
De acordo com relatos de testemunhas, os militares voltaram a utilizar armamento não letal na madrugada desta terça-feira (6) para reprimir uma manifestação. Não há informações sobre feridos.
A reportagem do UOL Notícias tentou entrar em contato com a chefia do Estado Maior e com o Comando Militar do Leste, mas não obteve resposta até o momento. O comando da Força de Pacificação já declarou à imprensa que a insatisfação popular pode ter sido influenciada pela existência de grupos criminosos que foram obrigados a agir silenciosamente após a ocupação policial no Complexo do Alemão.
Na segunda-feira (5), a Força de Pacificação já tinha sido alvo de uma manifestação promovida por mototaxistas da região, possivelmente insatisfeitos com a fiscalização rigorosa. Pelo menos sete pessoas foram presas e conduzidas para uma base militar situada na comunidade da Fazendinha.
Os motoqueiros fizeram várias fogueiras nas proximidades da favela Nova Brasília a fim de impedir o tráfego entre a estrada do Itararé e a avenida Itaoca - e o trânsito só foi normalizado após o trabalho do Corpo de Bombeiros.
Investigação
O Ministério Público Federal (MPF) abriu inquérito civil para investigar a atuação dos militares envolvidos no conflito com moradores do Complexo do Alemão no domingo (4). O procedimento será vinculado à apuração de incidente similar que aconteceu na Vila Cruzeiro, no dia 24 de julho, quando militares usaram spray de pimenta e balas de borracha contra moradores que estavam em um bar.
Segundo o MPF, as procuradoras Gisele Porto e Aline Caixeta estiveram na comunidade para ouvir os responsáveis pela Força de Pacificação. Elas receberam um relatório do general Cesar Leme Justo e do coronel Nilson Nunes, mas ainda irão ouvir a estudante Elaine Moraes, que deu entrada no Hospital Getúlio Vargas com uma bala de borracha alojada na boca, e outras vítimas do conflito.
No fim do mês passado, a Secretaria de Segurança Pública do Estado solicitou ao governo federal que mantivesse as tropas até pelo menos junho de 2012 –anteriormente, a expectativa era de que uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) fosse instalada na comunidade entre outubro e novembro deste ano. O morro foi ocupado pelas forças de segurança em novembro do ano passado.
O MPF infromou que, a partir de questionamentos da sociedade, promoverá debate no dia 6 de outubro para discutir a constitucionalidade da atuação do Exército na Segurança Pública. O debate será na sede da Procuradoria da República no Rio, com presença de juristas, representantes do Comando Militar do Leste e representantes da sociedade civil.
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