HAVANA, 13 Ago 2011 (AFP) -Apesar da chuva fina e do preconceito, a transexual Wendy Iriepa chegou triunfal, este sábado, ao Palácio dos Matrimônios de Havana em um carro conversível e trazendo a bandeira do arco-íris nos braços, para se casar com um nervoso dissidente gay.
A cerimônia, celebrada apenas três meses depois de o casal se conhecer, ocorreu no mesmo dia em que Fidel Castro completa 85 anos, como um "reconhecimento" ao líder, que há um ano admitiu sua responsabilidade na repressão aos homossexuais nos anos 60, disse o noivo, Ignacio Estrada, um soropositivo de 31 anos, que vestia terno branco e gravata vermelha.
"É o dia mais feliz da minha vida", derretia-se Wendy, de 37 anos, sentada no espaldar do conversível americano dos anos 50 enquanto, vaidosa, arrumava o longo vestido branco diante das câmeras dos jornalistas, cuja aglomeração parou o trânsito.
Alguns operários, cujo caminhão ficou preso no engarrafamento, gritavam, debochados, para Wendy: "Olha, sinhá moça!", em alusão à telenovela brasileira que faz sucesso em Cuba.
Wendy, que até 2007 era Alexis, se submeteu a uma das 16 cirurgias de mudança de sexo realizadas em Cuba desde 1988, a maioria delas auspiciadas pelo Centro Nacional de Educação Sexual (Cenesex), dirigido por Mariela Castro, filha do presidente Raúl Castro.
Ali a noiva trabalhou até 7 de julho passado, quando pediu demissão para se casar com Ignacio, ativista de um grupo LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais) que faz oposição ao governo.
"Estou muito contende de que se possa casar, não exatamente com um heterossexual, como queria (...), e nós lhe desejamos muitas felicidades", disse Mariela na sexta-feira à imprensa.
Dezenas de convidados jogaram arroz nos noivos na entrada do Palácio dos Matrimônios, uma instituição oficial dedicada a estas cerimônias que incluem, também neste caso, marcha nupcial e buquê de flores.
Entre os presentes estavam vários dissidentes, entre os quais os blogueiros opositores Yoani Sánchez e seu marido, Reynaldo Escobar, que foram os padrinhos.
"Agradeço a Mariela porque devo a ela parte desta realidade", disse Wendy apesar da ausência da diretora do Cenesex, que anunciou que não assistiria à cerimônia por não ter sido convidada.
O blogueiro e músico opositor Ciro Díaz, as Damas de Branco (vestindo roupas escuras na ocasião) Berta Soler e Laura Pollán, e o dissidente Manuel Cuesta Morúa manifestaram sua aprovação ao casamento e com a data escolhida.
"É muito interessante. Um acontecimento que de baixo e sem esperar a lei, está tentando impor o direito à diversidade", afirmou à AFP Cuesta Morúa.
No entanto, para o jornalista e blogueiro revolucionário Francisco Rodríguez - homossexual e portador do vírus HIV - "é um fato importante do ponto de vista humano".
"Definitivamente, tudo o que se fizer hoje em Cuba é importante porque é aniversário de Fidel", afirmou.
Uma centena de curiosos assistiu ao casamento do outro lado da calçada, alguns entre risos e piadas, outros envoltos em um silêncio de aprovação, mas também distanciados pelo caráter político da cerimônia.
Mariela Castro afirmou na sexta-feira que "existem fundos do governo americano para criar grupos LGBT contrários à posição do Cenesex (...) e há pessoas que se deixam seduzir por essas coisas".
A noiva se recusou a seguir a tradição de jogar o buquê pois, segundo ela, as flores serão depositadas em frente à casa de José Lezama Lima, um famoso escritor já falecido, que abordou o homossexualismo em sua obra.