Tribunal de Contas vê irregularidades na construção de kits sanitários para famílias carentes. Secretário diz que investigará caso
O governo do Ceará gastou, em média, R$ 29.629,63 por cada banheiro popular que construiu no interior do estado em 2010. Mais de 700 kits sanitários que deveriam beneficiar famílias carentes que vivem sem saneamento básico nunca saíram do papel.
No ano passado, o governo do Ceará liberou R$ 1,6 milhão para associações comunitárias construírem 800 banheiros populares. Com o valor pago pelo Estado, por meio de convênios, foram construídos apenas 54 desses equipamentos, segundo investigações do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Fazendo as contas, cada kit sanitário construído custou R$ 29.629,63.
O relatório parcial apresentado na quarta-feira (17) aos deputados estaduais pelo TCE constatou irregularidades em nove dos 16 municípios que já foram investigados. Mais 37 ainda vão passar por auditorias. Ao todo, 93 convênios firmados entre governo, prefeituras e associações no valor de R$ 17,5 milhões serão investigados em 54 municípios.
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A auditoria do TCE apontou ainda que o material utilizado na construção dos kits não é o mesmo do que está previsto no modelo emitido pela Secretaria das Cidades e que os banheiros estão sendo construídos às pressas para burlar as investigações. Além disso, segundo o relatório do tribunal, as associações estão prestando conta de convênio com banheiro construídos em 2008 como se fossem de 2010. Outro ponto é que a aptidão das associações em relação à capacidade de execução da construção dos kits não está sendo avaliada pela Secretaria das Cidades.
O atual secretário de Cidades do Governo do Estado, Camilo Santana (PT), admitiu na quarta-feira (17) que houve desvio de recursos, mas ponderou que a secretaria abriu uma sindicância para apurar as irregularidades e se isentou da responsabilidade de fiscalizar as obras. “Eu sou um secretário de Estado. É a equipe técnica que é paga pelo Estado para fiscalizar obras”. Camilo Santana assumiu a pasta em 2011, com a reeleição do governador Cid Gomes (PSB). Mas essa é uma secretaria que sempre foi comandada pelo PT, principal aliado do PSB no Ceará.
Presidente do BNB sob suspeita
Cinco dos convênios sob suspeita foram assinados pelo atual presidente do Banco do Nordeste (BNB), então secretário das Cidades do Ceará, Jurandir Santiago. Ele comandou a pasta entre 2 de abril e 6 de julho de 2010. Jurandir assumiu o BNB no início do mês de junho deste ano por uma indicação do vice-líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), e com a benção do governador do Ceará, Cid Gomes (PSB).
O presidente do BNB afirma que assinou os documentos para a liberação dos recursos quando era secretário tendo como base pareceres técnicos. Questionado se as denúncias envolvendo seu nome podem atrapalhar o trabalho a frente do BNB, ele se limitou a responder à reportagem do iG que fez tudo “dentro da legalidade” e que tem a “consciência tranquila”. Já José Guimarães foi evasivo, disse apenas que “isso não existe”, referindo-se às denúncias.
Denúncias
Os convênios com as associações para a construção de banheiros em comunidades carentes foram firmados por meio da Secretaria de Cidades do Estado do Ceará. Os recursos são do Fundo de Combate à Pobreza (Fecop). As denúncias de irregularidades vieram à tona em meados de julho, quando foi revelado pelo Jornal O Povo que a Associação Cultural de Pindoretama recebeu R$ 400 mil do Governo do Ceará para a construção de 200 kits sanitários, mas apenas três ficaram prontos.
A partir daí, houve uma sequência de novas denúncias contra várias associações sediadas em municípios próximos da região metropolitana de Fortaleza. Todos os suspeitos de desviar recursos são de alguma forma ligados ao ex-presidente do TCE, Teodorico Menezes. O conselheiro se afastou do cargo quando foi descoberto que todos os envolvidos nas denúncias de desvio fizeram doações para a campanha de seu filho, o deputado estadual Téo Menezes (PSDB).
Pedido de CPI
Na sessão de hoje, a deputada Eliane Novais (PSB) – que é do partido do governador Cid Gomes (PSB), mas pertence a uma ala rival – levou um bolo com vela para o plenário para “comemorar” um mês desde que as denúncias surgiram. O bolo foi oferecido apenas aos parlamentares que assinaram o pedido de CPI.
No início, o conselheiro Teodorico e o deputado Teo Menezes acabaram “catalisando” todas as suspeitas. Contudo, com o início das investigações do TCE e do Ministério Público Federal, irregularidades semelhantes foram encontradas em municípios espalhados por todo o Ceará. Isso levou o deputado Heitor Férrer (PDT) a entrar com um pedido de abertura de CPI na Assembleia do Ceará. O pedetista, porém, conseguiu apenas seis assinaturas das 12 que precisava.
Sem sucesso com o pedido de CPI, os deputados de oposição tentaram convocar os envolvidos a prestar esclarecimentos na Comissão de Fiscalização e Controle da Assembleia. A base governista se articulou e aprovou um outro requerimento para que, em vez disso, os deputados realizassem visitas aos órgãos que estão investigando o caso.
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